Outro dia li que as pessoas dormem 1/3 da vida. Assim, descobri que dos meus 45 anos dormi 15. É muito sono. Tentei imaginar o que eu teria feito durante estes 15 anos se estivesse acordada.
Percebi também que minha vida está divididas em capítulos de 15 anos. Estou até agora tentando descobrir qual desses capítulos eu passei dormindo. Seriam meus 15 anos de sono um capítulo à parte?
Com certeza foram os 15 primeiros anos que dormi, Pensei.
Os 15 primeiros, os sonhos da infância e da adolescência. Os sonhos da boneca nova,dos cabelos louros da mãe mais linda do mundo. A expectativa do natal, do aniversário. A praia e a galinha assada com macarrão e maionese no domingo... O sonho de um dia ser sorteada para o “ Boa Noite Cinderela” no programa do Silvio Santos, que na época era no canal 4 da rede Globo. O sonho de crescer e ser médica pediatra, de namorar o garoto da rua de baixo que sempre me aparecia vestido de cavalheiro medieval em uma carruagem do século XVIII, um tênis kchut e o topete do John Travolta, que mais tarde foi adotado pelo Presidente Itamar , que eu nem sonhava que existia. Com certeza, foram os primeiros 15 anos. Eu dormia. A vida era uma aventura regada à musicas da rádio Muuuundial!!!!!. E as tardes de domingo, sentada na calçada tomando guaraná em garrafinha de vidro escutando ao longe o locutor gritar: “... Deeeefeeeedeu Mazzaropi!”.O sonho de ver o garoto mais bonito do fim da rua, que passava numa mobilete e não tinha olhos na terra, eis que era um semi-deus e só via as semi-deusas ( e eu, embora sonhando não era uma) ... o sonho de ir ao cinema ( que depois virou uma Igreja Univeral) e lá ganhar o primeiro beijo do semi-deus e dar um pulinho até o céu para ver as estrelas.... O cheiro de fruta no ar das feiras-livres aos domingos... e as noites de angústia... quando contava nos dedos quantos anos faltam para chegar a 2000, que seria justamente o ano em que o mundo ia acabar segundo as meninas mais velhas da rua. O apertar as campainhas das raras casas que as possuíam e correr muito sem olhar para trás... O sonho e ouvir de madrugada o motor do caminhão... subindo o morro devagar e buzinhando... e eu encolhida quietinha fingindo que estava dormindo para papai não descobrir que eu havia acabado de entrar em casa.
Um dia... estava com os olhos inchados ... de chorar ou de dormir? Acho que foi quando acordei. Era o amanhecer de um novo capitulo...
Mas... não sei bem... penso que talvez aquele primeiro capítulo tenha realmente estado acordada, Pensei . Porque o que sucedeu foi um pesadelo. Um casamento de 15 anos onde não se podia acordar... quer dizer... pesadelo só não. Mas pesadelo. Eu provavelmente estava dormindo. Ninguém acordado ficaria tanto tempo assim numa situação tão desconfortável. Lá pelos trinta e poucos... acordei. Ufa... tinha sido só um pesadelo... pesadelo esquisito... mas tudo bem acordei. OU não?
Pensei. Não , foram esses 15 anos que dormi. Afinal, ali estâo as crianças. Dois homens que me restaram de três. Aqui estão meus dois diplomas. Ali está o pai dos meninos que também penou no pesadelo... acho que estava acordadinha.
Já sei. Não foi sono não. A partir de então , foi uma madorna de 15 anos. Dormitei. Foi na minha vida profissional. É claro que estava dormindo. Nenhum ser humano tem o trabalho perfeito. Bom salário, bom chefe, bons colegas de trabalho. Cama limpa para dormir e boa comida ( sem pagar nada, sempre da casa da amiga!). Era como deslizar sobre as ondas com uma prancha. Ai eu relaxei. Mas... não são só os titaniques que afundam. As pranchas também. No meio do mar tinha uma pedra. Tinha uma pedra no meio do mar. A minha prancha estava velha e cheia de lodo. Eu bem que tinha percebido que deveria ter comprado uma nova... aquele praia também não tinha mais as mesmas ondas e aquelas pedras todas que brotaram por perto.... Glub... glub.... a prancha furou. Quebrou toda. Eu sei nadar? Sei lá. Dá seu jeito. Relaxa e vai naquela ondinha ali até praia... acordei. Tudo bem...
Agora... estou tentando descobrir se estou mesmo acordado ou se estou dormindo. SE a vida real é esta de estar frente a tela do computador ou se amanhã vou acordar e descobrir que estava sonhando.
Mas de qualquer jeito... sendo isso um sonho, um pesadelo ou uma madorna... isso sou eu. E eu estou pensando isso tudo, se penso... é certo que, no mínimo, como dizia o filósofo, existo.
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Rosilane... ainda estou engatinhando por aqui. Mas fiquei feliz de logo encontrar referências deliciosas como o seu blog. Amei esse texto!
ResponderExcluirbjos